Pacientes em foco - Saúde Bucal e Alzheimer: A conexão e os cuidados essenciais

Pacientes em foco - 21.09.2024

Saúde Bucal e Alzheimer: A conexão e os cuidados essenciais

A relação entre saúde bucal e Alzheimer tem sido cada vez mais evidenciada, destacando a importância da prevenção e do cuidado oral para o bem-estar cognitivo dos idosos

Pesquisas recentes têm destacado a relação entre a saúde oral e o risco de demência
Pesquisas recentes têm destacado a relação entre a saúde oral e o risco de demência

Setembro é um mês dedicado à conscientização sobre as demências, simbolizado pelo Setembro Lilás. Em 2024, a campanha, liderada pela Federação Brasileira das Associações de Alzheimer (Febraz), traz o lema "Alzheimer: É Hora de Agir", ressaltando a necessidade urgente de desmistificar essa condição e ampliar o conhecimento sobre o Alzheimer, que afeta milhões de brasileiros e cidadãos ao redor do mundo.

A crescente incidência da doença é alarmante: atualmente, 1,76 milhão de brasileiros acima de 60 anos vivem com algum tipo de demência, e esse número deve aumentar drasticamente nas próximas décadas. Globalmente, mais de 50 milhões de pessoas convivem com a demência, e a previsão é que esse número triplique até 2050.

Nesse contexto, a correlação entre saúde bucal e o desenvolvimento da doença de Alzheimer emerge como um tema crucial. Pesquisas recentes têm destacado a relação entre a saúde oral e o risco de demência, acendendo um alerta para a importância de cuidar da saúde bucal como uma estratégia essencial para melhorar a qualidade de vida dos idosos. Compreender essa conexão é vital, especialmente em um momento em que a conscientização e a educação são mais necessárias do que nunca.

De acordo com a Odontogeriatra e diretora do Departamento de Odontogeriatria do Conselho Científico (COCI) da APCD, Dra. Maria Cecilia Ciaccio Vendola, "hoje temos uma série de artigos científicos, tanto internacionais quanto nacionais, que identificam uma correlação entre a quantidade de dentes naturais e o risco de desenvolver Alzheimer." Pacientes com menos dentes ou sem reabilitação adequada estão mais propensos à doença. Esse elo se fortalece ainda mais em casos de edentulismo total, ou seja, a perda completa dos dentes naturais, o que aumenta significativamente os riscos.

A Odontogeriatra e presidente da Câmara Técnica de Odontogeriatria do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP), Dra. Denise Tibério complementa essa ideia, destacando que os avanços nas ações preventivas têm ajudado a população a reter mais dentes ao longo da vida, como mostram os dados do levantamento de saúde bucal de 2020. Contudo, esse ganho vem acompanhado de outro desafio: a doença periodontal. “A doença periodontal é inflamatória, e alguns estudos sinalizam que as citocinas inflamatórias produzidas por essa condição podem comprometer a cognição do indivíduo, potencializando o risco de Alzheimer”, ela afirma.

A relação entre a doença periodontal e a progressão do Alzheimer está sendo amplamente estudada. Dra. Maria Cecília ressalta que a presença de algumas bactérias gram-negativas envolvidas na periodontite pode aumentar os riscos de desenvolvimento  de Alzheimer. "A periodontite, uma doença multifatorial, tem sido alvo de diversos estudos sobre como as bactérias gram-negativas ativas (que significa doença periodontal não controlada) podem aumentar as chances de desenvolvimento da doença", explica. Além disso, problemas como boca seca, que comprometem a produção adequada de saliva, também devem ser monitorados, pois afetam a saúde oral e geral.

A Dra. Denise aprofunda esse ponto, mencionando uma revisão de literatura publicada em 2024 que identificou como patógenos periodontais e citocinas pró-inflamatórias estão diretamente ligados ao processo neurodegenerativo do Alzheimer. No entanto, ela destaca a necessidade de mais estudos clínicos controlados para confirmar essa relação causal.

Identificar os primeiros sinais de problemas bucais é essencial, especialmente em idades avançadas. A Dra. Maria Cecilia lista alguns dos sintomas mais comuns que os pacientes e familiares devem observar: "Boca seca, perda de dentes, alteração no gosto e odor bucal, e sangramento gengival são indícios claros de que algo não está certo". A presença desses sinais, associados a uma higienização inadequada ou à falta de reabilitação oral, pode acelerar o declínio da saúde bucal e afetar outras funções corporais, como a digestão.

A Dra. Denise Tibério ressalta, no entanto, que nos estágios mais avançados de Alzheimer, os pacientes podem não conseguir verbalizar desconfortos bucais. “Qualquer mudança de comportamento pode sinalizar dor ou desconforto, o que torna crucial uma avaliação odontológica especializada”, observa.
           
Práticas de higiene e cuidados específicos para pacientes com Alzheimer

Manter a saúde bucal é um desafio em qualquer idade, mas para pacientes com Alzheimer, esse cuidado se torna ainda mais crítico. A Dra. Maria Cecilia reforça que práticas simples, como escovação regular, uso de escovas adequadas e controle da dieta, são fundamentais para todos os pacientes. "Pacientes com Alzheimer precisam muitas vezes de ajuda na escovação, e dispositivos como escovas elétricas podem facilitar essa tarefa", sugere.

A Dra. Denise detalha os cuidados conforme a progressão da doença: na fase inicial, o paciente muitas vezes ainda consegue manter sua higiene, com orientações específicas de um Odontogeriatra. Já na fase intermediária, cuidadores precisam ser treinados para realizar a higienização corretamente, enquanto na fase avançada, muitas vezes a atuação odontológica ocorre em centro cirúrgico, devido à complexidade do quadro.

Para os pacientes com Alzheimer em estágio avançado, o apoio dos cuidadores e familiares é indispensável. "Esses pacientes tornam-se dependentes e entram no quadro de fragilidade cognitiva", explica a Dra. Maria Cecilia. No entanto, ela chama atenção para um problema frequente: a falta de preparo adequado dos cuidadores, tanto formais quanto informais, para lidar com a saúde bucal. "Estudos mostram que os cuidadores, muitas vezes, não têm o conhecimento necessário para seguir as diretrizes de saúde oral, o que compromete ainda mais o cuidado com esses pacientes." Assim, a conscientização e o treinamento desses profissionais se tornam essenciais para garantir que a saúde bucal seja mantida, prevenindo complicações que podem impactar diretamente a qualidade de vida do paciente.

A correlação entre Alzheimer e saúde bucal reforça a importância de uma atenção integral ao idoso. Manter a boca saudável é, mais do que nunca, uma questão de saúde geral e deve ser uma prioridade para profissionais, cuidadores e familiares.

Como as especialistas destacam, cuidar da saúde oral é cuidar da saúde do corpo e da mente, em todas as fases da vida.

Por Swellyn França