Odontologia - 29.07.2024
Hepatites Virais: Prevenção Essencial no Consultório Odontológico
Imunização, biossegurança e educação são essenciais para a eliminação das hepatites virais
As hepatites virais, especialmente as hepatites B e C, são doenças que requerem atenção na prática odontológica devido ao potencial de transmissão durante procedimentos clínicos. De acordo com o Boletim Epidemiológico das Hepatites Virais de 2024, do Ministério da Saúde, entre 2000 e 2023, foram registrados 780.123 casos confirmados de hepatites virais no Brasil, com 285.432 casos de hepatite B e 310.567 de hepatite C, resultando em 90.123 óbitos. Esses números reforçam a importância da conscientização e da adoção de medidas preventivas eficazes em ambientes odontológicos para garantir a segurança de pacientes e profissionais.
No consultório odontológico, a transmissão dos vírus da hepatite B e C pode ocorrer por meio do contato com sangue e saliva contaminados, além do uso de instrumentos perfurocortantes. "A hepatite B é frequentemente transmitida por relações sexuais desprotegidas, mas a transmissão parenteral também é possível, como por rompimento da mucosa oral durante procedimentos cirúrgicos. O vírus da hepatite B pode permanecer viável fora do corpo por longos períodos, como em uma gota de sangue, e pode infectar indivíduos suscetíveis mais facilmente do que o vírus da hepatite C e o HIV", explica o Dr. Jefferson Tenório, professor adjunto de Estomatologia do departamento de Patologia e Diagnóstico Oral, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele ressalta que a maioria dos pacientes infectados com a hepatite B tem poucos ou nenhum sintoma, com a icterícia sendo rara. Além disso, a hepatite B tem baixo risco de cronificação e existe vacina disponível no Calendário Nacional de Vacinação do Sistema Único de Saúde (SUS).
A hepatite C, por sua vez, é transmitida principalmente por via parenteral, através do contato com sangue contaminado, como no compartilhamento de agulhas ou na reutilização inadequada de equipamentos médicos e odontológicos. "A infecção geralmente é subclínica ou assintomática, sendo muitas vezes descoberta apenas em sua fase crônica. Os sintomas são escassos e inespecíficos, permitindo que a doença evolua por décadas sem suspeição clínica. O diagnóstico geralmente ocorre após teste sorológico de rotina ou doação de sangue. A hepatite C crônica pode levar à cirrose hepática, hepatocarcinoma e manifestações extra-hepáticas, como o líquen plano, que pode afetar a mucosa oral”, alerta o Dr. Jefferson.
De acordo com o doutor em Epidemiologia e coordenador de Apoio à Imunização do Ministério da Saúde, Dr. Ricardo Gadelha de Abreu, os cirurgiões-dentistas precisam se apropriar mais do tema das hepatites virais para conscientizar a população. "Os cirurgiões-dentistas devem conhecer bem as hepatites virais, suas formas de transmissão e a importância da prevenção", afirma. Ele destaca que a hepatite B é uma doença imunoprevenível, com vacina disponível para todos, e que os profissionais devem estar vacinados com o esquema completo de três doses e estimular seus pacientes a fazerem o mesmo.
Em relação às medidas preventivas, Dr. Ricardo reforça que os cirurgiões-dentistas devem adotar práticas rigorosas de biossegurança, que incluem a esterilização adequada de instrumentos, desinfecção de superfícies, descarte apropriado de materiais perfurocortantes e equipamentos de proteção individual. “É crucial que toda a equipe odontológica esteja imunizada contra a hepatite B e realize testagens regulares para hepatites B e C. Ele também observa que a conscientização sobre a hepatite Delta, que é mais prevalente na região Norte do Brasil e depende da presença do vírus da hepatite B, é importante. A hepatite Delta pode ser evitada com a vacinação contra a hepatite B, e muitos profissionais desconhecem essa hepatite”, alerta.
Além das práticas de biossegurança, a educação dos pacientes sobre a importância da prevenção e da testagem regular é crucial. “Durante a anamnese, o cirurgião-dentista pode informar aos seus pacientes que alguns grupos populacionais, por sua maior vulnerabilidade, devem ser testados de forma periódica pelo menos uma vez ao ano, para os vírus das hepatites B e C. Esses grupos incluem: pessoas vivendo com HIV, pessoas com múltiplos parceiros sexuais ou com múltiplas infecções sexualmente transmissíveis, pessoas trans, trabalhadores do sexo, pessoas em situação de rua, pacientes ou profissionais de saúde que tenham frequentado ambientes de hemodiálise, pessoas com antecedente de uso de drogas injetáveis, pessoas privadas de liberdade, pessoas com antecedente de exposição percutânea/parenteral a sangue ou outros materiais biológicos em locais que não obedeçam às normas da vigilância sanitária (ambientes de assistência à saúde, realização de tatuagens, escarificações, piercing, manicure, uso de lâminas de barbear ou outros instrumentos perfurocortantes)”, detalha o Dr. Jefferson.
Dr. Ricardo Gadelha reforça a importância de motivar os pacientes a se vacinarem contra a hepatite B e realizarem testes rápidos. "Uma das metas do Brasil é eliminar as hepatites B e C até 2030, e os profissionais de saúde, incluindo os cirurgiões-dentistas, têm um papel fundamental nesse esforço. O SUS oferece vacinas e testes de forma universal e gratuita, e é crucial que os cirurgiões-dentistas encaminhem seus pacientes para essas oportunidades de prevenção e diagnóstico. A vacinação contra a hepatite B é universal, ou seja, qualquer pessoa tem acesso a ela nas salas de vacinação do SUS", acrescenta.
Por fim, Dr. Jefferson salienta que as hepatites virais são doenças de notificação compulsória. “Ou seja, na medida em que o cirurgião-dentista diagnosticar um caso de infecção por hepatite, este caso deve ser notificado e registrado no Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan) em até sete dias”, lembra.
Por Swellyn França