Odontologia - Cuidado de pessoas vivendo com HIV: perspectivas sobre saúde e prevenção

Odontologia - 09.12.2024

Cuidado de pessoas vivendo com HIV: perspectivas sobre saúde e prevenção

A integração entre avanços científicos, cuidado multiprofissional e combate ao estigma é essencial para melhorar a qualidade de vida das pessoas vivendo com HIV

Avanços na terapia antirretroviral transformaram o panorama, reduzindo significativamente as manifestações clínicas do HIV
Avanços na terapia antirretroviral transformaram o panorama, reduzindo significativamente as manifestações clínicas do HIV

O Brasil tem aproximadamente 1 milhão de pessoas vivendo com HIV, segundo estimativas do Ministério da Saúde. Apesar dos avanços no tratamento e na prevenção, o diagnóstico tardio ainda é uma realidade preocupante, frequentemente impulsionada pelo preconceito e pela dificuldade de acesso a serviços de saúde. Além disso, o estigma associado à doença continua a impactar negativamente a qualidade de vida dos pacientes, exigindo esforços integrados e conscientização coletiva.

Nos anos 1980 e 1990, quando o HIV emergiu como uma epidemia global, a população afetada enfrentava discriminação extrema, inclusive em consultórios odontológicos. "Poucos profissionais atendiam essa população", relembra o Cirurgião-Dentista Dr. Décio Roberto Masini, do Núcleo de Odontologia do Centro de Referência e Treinamento DST/Aids. "O medo e o preconceito eram os principais fatores. Isso começou a mudar com os treinamentos que capacitavam os profissionais e conscientizavam sobre a necessidade de atender esses pacientes."

Atualmente, os avanços na terapia antirretroviral (TARV) transformaram o panorama, reduzindo significativamente as manifestações clínicas do HIV. "Os medicamentos modernos permitem alcançar uma carga viral indetectável, o que elimina o risco de transmissão sexual do vírus — um conceito conhecido como I=0 (Indetectável = Zero Transmissão)", explica o infectologista Dr. Mateus Ettori Cardoso, do Grupo Técnico Médico Hospitalar da Vigilância Sanitária de SP e de Pesquisa Clínica do CRT DST/Aids - SP.

A ampliação das estratégias de prevenção também é um marco importante. “A Prevenção Combinada, que alia abordagens biológicas, sociais e comportamentais, inclui ferramentas como a Profilaxia Pré-Exposição (PrEP) e a Profilaxia Pós-Exposição (PEP), além de testes rápidos e autotestes. Essas estratégias, ficam mais seguras quando combinadas com o uso de preservativos”, salienta o Dr. Mateus.

Apesar desses avanços, as manifestações bucais associadas ao HIV ainda exigem atenção, especialmente em casos de pacientes sem acesso ao tratamento adequado ou com coinfecções. Dr. Décio destaca que, no início da epidemia, "lesões como candidoses orais, leucoplasias pilosas e sarcoma de Kaposi eram muito frequentes, compondo uma tríade de sinais sugestivos de infecção pelo HIV". Ele observa que essas condições diminuíram substancialmente com o avanço do tratamento, mas alerta para o aumento de lesões relacionadas ao HPV, especialmente em pacientes imunossuprimidos.

Nesse contexto, os Cirurgiões-Dentistas desempenham um papel crucial tanto no diagnóstico precoce quanto na melhoria da qualidade de vida desses pacientes. "Lesões bucais podem ser os primeiros sinais de infecção pelo HIV", aponta Dr. Mateus, destacando a importância de uma avaliação criteriosa.

Para o Dr. Décio, o impacto do cuidado odontológico vai além do aspecto clínico: "Nas populações mais vulneráveis, o tratamento odontológico pode promover a melhora da autoestima e incentivar os pacientes a aderirem corretamente ao tratamento antirretroviral."

Desde 2020, os Cirurgiões-Dentistas no Brasil estão autorizados a prescrever a PrEP, ampliando sua contribuição na prevenção da transmissão do HIV. Essa possibilidade, segundo os especialistas, reforça a necessidade de um trabalho multiprofissional integrado. "Se quer ir mais rápido, vá sozinho. Se quer ir mais longe, vá em equipe", afirma Dr. Mateus, ressaltando o valor do cuidado coletivo.

Combinando conhecimento, acesso e ações integradas, o Brasil avança no enfrentamento do HIV. No entanto, como destacam os especialistas, ainda há um longo caminho a ser percorrido para eliminar o preconceito e garantir um cuidado integral a todos os pacientes.

Por Swellyn França