Odontologia - 22.03.2024
Água e fluoreto - combinação beneficia a saúde bucal há mais de 70 anos
A cárie é uma doença que provoca dor, sofrimento, tem alto custo de tratamento e continua atingindo mais de 2,5 bilhões de pessoas ao redor do mundo. Além da água ser vital para a sobrevivência humana, ela desempenha um papel fundamental no processo de manutenção da saúde dentária. Mais de 400 milhões de pessoas ao redor do mundo são beneficiadas por água tratada e fluoretada. Desde a década de 50 no Brasil, a água potável distribuída pelo sistema público de abastecimento colabora para a prevenção da cárie, graças ao processo conhecido como fluoretação.
A fluoretação da água é uma importante estratégia para o controle de cárie porque beneficia indistintamente todas as pessoas de uma cidade que apresenta sistema de tratamento da água, como explica o cirurgião-dentista, doutor em Bioquímica e pesquisador sobre o uso de fluoretos em Cariologia, Prof. Dr. Jaime A. Cury: “Toda água contém fluoreto natural em diferentes concentrações. Assim, a fluoretação da água é o ajuste da concentração de fluoreto presente em uma água de abastecimento público para se obter o equilíbrio do benefício anticárie com o risco mínimo de fluorose dentária nesta estratégia de saúde coletiva”.
Fluoreto na medida certa
O especialista esclarece que a responsabilidade pelo ajuste da concentração de fluoreto da água de qualquer cidade é do sistema de tratamento local, seja ele público ou privado. Para acertar a concentração de fluoreto da água a ser oferecida para a população, são usadas duas fontes seguras: o fluorsilicato de sódio (Na2SiF6) ou o ácido fluorsilícico (H2SiF6). Estes são controladamente adicionados à água tratada (potável) para se obter uma concentração média de 0,7 ppm F (mg F/litro), sendo aceita uma faixa de variabilidade de mínimo de 0,6 e máximo de 0,8.
Essa concentração, de acordo com o Prof. Jaime, é totalmente segura para a saúde geral da população. Ele explica que existe mais concentração natural de fluoreto numa xícara de 200ml de chá preto feito com água não fluoretada do que em um copo d´água (200ml) fluoretada.
Dr. Jaime informa que é preciso lembrar que a cárie não é provocada por falta de fluoreto, mas sim pelo consumo frequente de produtos contendo açúcar (doces, refrigerantes, etc.) e que o fluoreto eficazmente reduz o efeito cariogênico do açúcar.
Ele explica que, na ausência de fluoreto, a cárie progride rapidamente, levando à perda do dente. “O efeito do fluoreto pode ser obtido escovando os dentes com pasta fluoretada, fazendo a aplicação profissional de fluoreto e pela água com flúor. Neste contexto, a água fluoretada é o meio mais simples de manter fluoreto constantemente na cavidade bucal para interferir com o desenvolvimento da cárie - e isso pode ser conseguido tanto bebendo água, como ingerindo alimentos com ela cozidos”.
Contudo, o especialista acrescenta que, para garantir este efeito benéfico do fluoreto da água, a fluoretação dela não pode ser paralisada ou interrompida, por qualquer questão que seja. Afinal, “fluoreto não é vacina”, como diz o cirurgião-dentista.
Importância comprovada pela Ciência e por décadas de uso
Em termos de estudos e atualidade sobre a fluoretação da água, o Dr. Jaime declara que o dado novo e mais importante tem sido a comprovação de que a fluoretação da água potável continua sendo uma estratégia de saúde pública importante para o controle da cárie, mesmo hoje, em pleno século XXI, seja para o Brasil, seja para países desenvolvidos, como Austrália e Estados Unidos, entre outros.
“O fato mais importante, que o fluoreto da água continua sendo imprescindível, tem sido constatado recentemente, quando, por questões políticas, a fluoretação foi paralisada em algumas cidades. A importância do fluoreto da água foi comprovada no Alaska, Canadá e Israel, pelo aumento da cárie quando interromperam a fluoretação”.
O especialista enfatiza que a cárie é uma doença não erradicável que pode atingir todos durante a vida toda, da infância à senescência, que necessita ser controlada e que tem o fluoreto como a única substância conhecida capaz de reduzir o efeito destrutivo que o açúcar da dieta humana provoca nos dentes.
Com relação ao receio, ou mesmo a posição contrária em relação ao uso do flúor na água, manifestada, inclusive, em redes sociais, o Dr. Jaime reforça que a ciência assegura o uso da substância.
Ele recorda que, desde 1950, quando a agregação de fluoreto à água de abastecimento público foi implementada nos Estados Unidos, ela tem sobrevivido às mais sórdidas alegações, cujas razões têm mudado de décadas em décadas e de um século para outro. “Tais alegações não são baseadas em evidência científica, mas são parte do arsenal das teorias conspiratórias de grupos que propagam inverdades nas redes sociais e que atingem não só a fluoretação da água, mas também vacinas e outras estratégias importantes para a vida das pessoas”.
O Dr. Jaime lembra, ainda, que o processo de fluoretação da água já foi tachado como um plano comunista idealizado pelos russos no pós-2ª Guerra Mundial para diminuir a inteligência dos americanos e fazer a antiga União Soviética dominar o mundo. “Essa alegação política do século passado, no formato de teoria das conspirações, está sendo hoje alimentada pelas alegações de que flúor é uma neurotoxina que afeta o QI das pessoas. Essa e outras alegações, como a de que flúor provoca hipotireoidismo, têm sido cientificamente contestadas pela prática da Odontologia baseada em evidência científica”.
Por fim, o especialista declara que a agregação de fluoreto ao tratamento da água continua sendo recomendada porque o único efeito colateral sistêmico associado à ingestão de água otimamente fluoretada (~0,7 ppm F) é fluorose dental (alteração do esmalte dentário relacionada ao excesso de ingestão do flúor na época de formação dos dentes), a qual não compromete a qualidade de vida das pessoas acometidas.
Vale reforçar que, há mais de 70 anos, milhões de pessoas ao redor do mundo têm sido beneficiadas por programas governamentais de água fluoretada pela sua eficiência de redução de cárie, sem nenhum risco para a saúde geral das pessoas. Isso, segundo o Dr. Jaime, tem sido comprovado em locais onde as populações escovam seus dentes com dentifrícios (gel, pasta, creme) fluoretados, como se demonstra não só no Brasil, como na Austrália, Estados Unidos, Irlanda, Nova Zelândia, etc. Portanto, o uso do flúor na água e também em produtos de higiene bucal é comprovadamente eficaz e segura.
Fonte: CROSP